Fechar menu

Breve homenagem no centenário de Natália Correia

Artigo de opinião de Maria Inês Mendanha

A 13 de setembro de 1923, nascia nos Açores aquela que viria a ser uma das mais fascinantes mulheres portuguesas; Natália Correia foi tudo o que quis: poeta (não gostava do termo “poetisa” e em certa medida, compreendo porquê), escritora, ativista e política. E se mais quisesse, mais alcançaria; é que Natália é uma daquelas pessoas que fez, de facto, muito em vida e continuou a fazer depois de desaparecer, ao ponto de um século depois do seu nascimento e 30 anos depois de morrer, aqui estou eu (e como eu tantos) a relembrá-la e a prestar-lhe homenagem.

A sua obra enquanto poeta e escritora é vastíssima: abarca poesia, romances, teatro, literatura de viagens, antologias e outros, sempre com obras pinceladas com a sua astúcia, combatividade, frontalidade e perspicácia. Escreveu sobre o feminismo, o amor, o erotismo, o europeísmo e a ditadura, deixando-nos lições e pensamentos que ainda hoje são verdadeiros e acertados. Cruzou-se, pensando a cultura portuguesa e o país, nos anos 50 e 60, com alguns dos mais notáveis intelectuais e artistas portugueses, desde Amália a Ary dos Santos ou Almada Negreiros. A sua visão para Portugal era antagónica à do Estado Novo, tendo lutado contra a ditadura, através da sua escrita e da sua colaboração com outros resistentes. Já depois do 25 de abril, participou na democratização do país, como deputada à Assembleia da República, tendo iluminado o nosso parlamento com intervenções inesquecíveis.

Os seus valores estiveram sempre plasmados nas suas obras, enquanto escritora e mais tarde, como política. Natália foi uma acérrima defensora dos Direitos Humanos, com particular ênfase nos direitos das mulheres: se em ditadura defendia o direito das mulheres ao voto, já em democracia, era favorável à despenalização do aborto, enquanto mecanismo de proteção das mulheres, para, por exemplo, mitigar os abortos clandestinos. Na sequência de uma visita aos Estados Unidos da América nos anos 50, fortaleceu as suas crenças europeístas, tendo chocado de frente com a realidade americana de falta de humanismo e isolacionismo primitivo, que a levou a abraçar a cooperação europeia. Foi até ao fim da vida defensora da importância da cultura e do seu peso na identidade nacional.

A meu ver, Natália foi uma personagem fascinante do século XX, com uma obra e legado palpáveis, atuais e corajosos. É uma daquelas pessoas especiais, cujas lutas, causas e obras nos são tão próximas que a tornam parte da nossa vida; a sua obra garantiu-lhe a honra de ser tratada apenas pelo primeiro nome e mesmo assim ser inconfundível, única. Já tivemos algumas pessoas assim: Amália, Sophia, Simone, Elvis. Além destas, no meu lote de pessoas únicas, figura também Natália, uma mulher cujas ideias me são tão próximas que é como se a tivesse conhecido. E como gostaria eu de o ter feito.

Opinião

Maria Mendanha
06 de Out de 2023 0

Outras artigos

desenvolvido por aznegocios.pt