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"As mulheres são superiores aos homens em termos biológicos"

José Eduardo PINTO DA COSTA

Catedrático esteve em Barcelos a convite da Associação de Pais e Amigos das Crianças Inadaptadas.

Nascido no Porto, em 1934, José Eduardo Pinto da Costa possui um percurso notável a nível académico e profissional. Doutorado em Medicina Legal, actualmente é professor jubilado no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto, entre outros cargos. Autor de vários livros, Pinto da Costa também esteve ligado ao associativismo desportivo, enquanto presidente da Associação de Patinagem do Porto (1969-1971), presidente da Associação de Boxe e presidente da Assembleia-Geral da Federação Portuguesa de Hóquei. Entre inúmeras distinções, foi eleito uma das cem personalidades portuenses do século XX, pela projecção nacional e internacional que proporcionou à cidade invicta, na área da Cultura, da Educação e da Justiça.
O BP aproveitou a passagem de José Eduardo Pinto da Costa por Barcelos e esteve à conversa com o conferencista, que falou sobre dignidade humana, ética, Medicina Legal, aborto, eutanásia e ciência forense, tão em voga com as séries televisivas do género do CSI.

A dignidade humana continua a ser um bem supremo?
Acho que sim. Segundo o Código Civil, a pessoa é dotada de personalidade quando nasce com vida e extingue-se com a morte. Ora, todo o processo deve ser imbuído de dignidade. E porquê? Porque há vida, simplesmente. A vida humana é um bem que deve ser protegido até ao fim. Podemos questionar se há dignidade ou não já no ventre materno, uma vez que a mulher grávida não tem uma pessoa dentro de si, mas carrega, pelo menos, um projecto de ser humano.

Foi fundador da Sociedade Médico-Legal de Portugal. Chegou a referir que a organização nasceu para desfazer a falácia que a Medicina Legal seria apenas a medicina dos mortos, a ciência dos tiros e das facadas. Na sua opinião, essa desmistificação foi conseguida?
Sim, em parte. Ou melhor, cada vez há mais pessoas conscientes disso. A medicina legal contemporânea não diz respeito apenas aos mortos, também é, mas não só. Todos os casos de vivos, a regulação do poder paternal, questões de identidade, filiação, etc., também estão no âmbito da medicina legal.

Sobre a despenalização do aborto, chegou a dizer que era contra o aborto e a favor da mulher. Acha injusto condenar uma mulher por abortar?
O aborto continua a ser crime, há determinadas circunstâncias em que ele é despenalizado. Se a mulher abortou fora das prerrogativas previstas na lei, terá que ser condenada, claro. Aquilo que  defendo é a liberdade de escolha.
Só não concordo com uma parte da lei, que acho que é uma incongruência. Uma menina está grávida por violação, não tem 16 anos, não quer abortar, embora tenha direito a isso por via da violação, mas a lei diz que a decisão cabe ao pai ou à mãe. Quer dizer, uma menina com 15 anos e menos um dia para fazer 16, não tem capacidade para discernir e procurar nos seus interesses aquilo que quer, mas no dia seguinte, já tem. É um disparate.

Hoje em dia, a mulher tem que desempenhar simultaneamente vários papéis na sociedade. Há ou não igualdade de géneros?
Não sou feminista nem machista, mas acho que as mulheres são superiores aos homens em termos biológicos. Em termos práticos, isso reflecte-se nessa capacidade de a mulher conseguir desempenhar vários papéis em sociedade. O hipotálamo, onde estão os centros essenciais à vida, é responsável pelos processos metabólicos e por outras actividades autónomas e é também o principal centro de expressão emocional e do comportamento sexual. É nesta região do cérebro que está o segredo de certos pormenores de superioridade da mulher. O sistema feminino é muito mais apurado que o do homem, por isso é que as mulheres vivem mais tempo, por exemplo.

Outro tema actual e polémico, o que tem a dizer sobre o direito a morrer?
Na actual conjuntura normativa, a eutanásia não é permitida, nem a ajuda ao suicídio. O suicídio não é punível, mas a ajuda, o incitamento ou a propaganda ao suicídio é considerada crime pela legislação portuguesa. Se a eutanásia for consecutiva à vontade expressa, consciente, observada, reiterada, durante um certo período de tempo, aí acho a eutanásia admissível. Quando o interessado deseja morrer consciente e inequivocamente, na base do consentimento informado, e não num acto emocional inesperado, mas não tem capacidade física nem neurodinâmica para se poder suicidar, aí parece-me que sim. Sem haver a vontade inequívoca e ser outro a matar, isso não é eutanásia, é voltar atrás no tempo.

Portugal está preparado para discutir a questão da eutanásia?
Portugal está preparado é para discutir futebol (risos)... tirando isso, pelas discussões que vejo por aí, não me parece que o país esteja preparado para falar de questões mais sérias.

Tem ideia de quantas autópsias já fez ao longo da sua carreira?
Mais de trinta mil.

Acha que as séries televisivas do género do CSI fez crescer o interesse dos portugueses pela Medicina Legal?
Sim, e em grande medida porque as pessoas estão susceptíveis a tudo o que é crime. Em boa verdade, a série tem o seu quê de positivo.

Até que ponto a ficção influencia a realidade?
Há muita fantasia à mistura. Os polícias andam no meio daquele esterco todo e andam sempre limpos, bem penteados e aprumados. Se não estivessem a gente mudava de canal, não era? A rapidez com que as coisas acontecem  e se resolvem também é pura ficção, é óbvio. Na realidade, os casos não se solucionam assim tão rápido. Mas tem a vantagem, pelo menos, de despertar os portugueses para exigir da polícia e dos técnicos legais o rigor que é aí apresentado como paradigma.

Como analisa o caso Maddie McCann? A prova de ADN pode confirmar uma linha de investigação?
Como já tenho dito, o caso da Maddie há-de resolver-se num princípio bem português: Zagam-se as comadres, descobrem-se as verdades. Para se garantir que o sangue possa pertencer à criança, são precisas várias coisas: primeiro, que  a chamada custódia tenha sido assegurada, ou seja, tem de haver a certeza absoluta de que o sangue não foi conspurcado; depois, há a questão do DNA, que pode sofrer mutações, com o tempo e por outras circunstâncias. As impressões digitais são mais fidedignas, têm mais valor do que o DNA.

Entrevista

Barcelos Popular
Texto
30 de Abr de 2008 0

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